Me arrisco
- Marcelo Pimenta
- há 7 dias
- 2 min de leitura

Me arrisco, entre uma e outra cólica,
me arrisco.
Quando minha respiração consegue, com o coração, uma música —
seja leve, seja breve, sempre ocasional, aleatória —
minhas racionalidades se escondem nos receios.
E penso no precoce.
Quando meu ânimo prevalece,
tomo mais um suco, mais um.
Consigo desabrochar até um limite que desconheço.
Me arrisco.
Dura pouco,
e me invade uma cortina.
Abre, revela — lá estou, na cama:
um peso no corpo, o ar denso e quente,
a inspiração perde o sentido.
Quantas serão, até me arriscar outra vez?
Expiro.
Existo assim mesmo.
Mais um suco.
De nada adianta.
Apenas me pesa.
Penso no precoce.
Me leva, me pesa.
Tudo me soa à mentira.
Me cessa.
Me arrisco.
Outra vez, a sensação amarela por detrás da cortina.
Amarelado.
Logo eu — a cor lesa,
o ar denso e quente.
Moro dentro da expiração.
Sou prisioneiro da expiração.
Me exaure, me bate, por último,
me abate.
Sinto dor enquanto expiro.
Todas.
Em menos de um segundo,
fica tudo amarelo.
Fica tudo.
Não consigo sair.
Quando expiro,
vejo na parede um quadro de mim mesmo
me vendo, me vendo.
Me dôo.
Mas sou amarelado, de tão abafado.
Uma moldura abafada.
Sou um papel puído.
E ninguém me compra.
Para me soltar.
Para me dar alguma chance.
Me arrisco — leviano —
é tudo que tenho.
Pouco tempo.
Inspiro,
e não dá tempo de fugir.
Então, algum concerto ocasional.
Me arrisco.
Dura pouco,
e caio.
Em palavras mal ditas,
se enrolam letras para caber no tempo.
Caio na palavra quando me arrisco.
Nada tenho.
Talvez a consciência do presente me inspirasse
mas nem coragem tenho.
Calo a boca maldita e me aguardo.
Um dia, me arrisco.
Te digo: vai.
E você me acene de longe,
do amarelo.
Enquanto isso,
me derreto em minha frente.
Que homem é esse?
Que futuro me aguarda?
Se serei, um dia, feliz — como já fui.
Se me emocionarei.
Se algum tesão me tomará
ou serei apenas o resto do amarelo:
um porta-retratos manco,
que nem eu vejo.
Se me arrisco precoce.
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